7.12.14

História da Casa da Fontinha ( III ) - Prólogo de Gustavo de Matos Sequeira


"Rerum Cognoscere Causas"




aber a origem das coisas, é natural desejo que a todos toma o ânimo, e quando, de simples curiosidade, esse desejo sobe à análise atenta das mesmas origens para estudo do tempo presente e se investiga o passado para explicação de factos actuais, o conhecimento da vida que lá vai, constituída pela acção das vidas extintas de que proviemos e determinada por elas, adquire os foros não só de um intenso prazer intelectual senão de uma verdadeira ciência que nos distrai, estimula e satisfaz.

As nossas recordações prolongam-se pelo tempo e espaço, adquire-se um passado mais vasto e achamos na vida dos nossos maiores um prolongamento da nossa. É uma revivescência de mil coisas extintas, um criar de novos seres e de novos mundos, num complemento de nós mesmos. Averiguar das existências findas, recompô-las, fazer mover as figuras, formar cenas e quadros é a missão natural do genealogista na acepção exacta do termo; e esse seu trabalho, desacreditado outrora com o delírio do invencionismo fradesco mas hoje reabilitado à luz da moderna ciência histórica, é dos melhores auxiliares da arqueologia dos costumes, quase elemento indispensável para quem quiser forragear em arquivos e bibliotecas qualquer troço da nossa história que, sendo a soma de todos os factores que nela influíram, não é mais do que a vida dos personagens que a realizaram.

Um caderno de apontamentos familiares, resenha de factos, relatório de datas, amontoado de notas íntimas, é sempre um grande capital que se acumula e que há-de produzir, feito lição, exemplo e estímulo, proveitosos juros para os filhos nas consolações morais que dele lhe advirão, acumulados, quiçá, de geração em geração, frutificando sempre e dando largas colheitas de recordações e de saudades aos que de nós vierem perpetuando o nosso nome, o nosso carácter e a nossa maneira de ser.

Quem, alheando-se do passado e não cuidando do futuro, deixar de estabelecer consigo próprio, a ligação entre o que acabou e o que vai começar, passa na vida sem razão de ser, deixou de exercer a sua função, apaga-se e perde-se. Foi um elemento nulo. Deixar aos filhos a história dos pais, guardar para os netos a memória dos avós, é fixar-se na lembrança dos seus, o que equivale a sobreviver à sua mesma vida.

VALE.

GUSTAVO DE MATOS SEQUEIRA


*Prólogo escrito nos anos 30 do século XX, a pedido de António Fernando de Sequeira Sottomayor para o seu trabalho “Apontamentos Genealógicos”.

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